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Ninguém Ama Ninguém... Por Mais de Dois Anos

Titulo Original: Ninguém Ama Ninguém... Por Mais de Dois Anos

Ninguém Ama Ninguém... é sofisticado, mas falta unidade

Adalberto Meireles | Jornalista

Foto: Divulgação
Foto: Divulgação

Quando começou a escrever os pequenos contos de A Vida Como Ela É para o jornal Última Hora, a pedido de Samuel Wainer, em 1950, Nelson Rodrigues era conhecido por peças como A Mulher Sem Pecado (1941), Vestido de Noiva (1943) e Álbum de Família (1946), sobretudo a segunda, com a qual desarticulou a noção de espaço e tempo real e psicológico no texto teatral clássico.

Sucesso, as histórias foram narradas no rádio, viraram fotonovela, peça de teatro, quadro de programa de televisão, mas pouco renderam ao cinema, enquanto outras obras do escritor chegavam exaustivamente às telas.

Talvez o único filme inspirado na série escrita por Rodrigues, além de Traição (1997), de Arthur Fontes, Cláudio Torres e José Henrique Fonseca, e Gêmeas (1999), de Andrucha Waddington, seja A Dama do Lotação (1978), de Neville d’Almeida, que agora vem encontrar de algum modo um correspondente em Ninguém Ama Ninguém... Por Mais de Dois Anos, de Clovis Mello.

Festejado diretor de comerciais, não seria agora que Mello negaria a origem, ao adaptar cinco histórias de A Vida Como Ela É – Coroa de Orquídeas, Rainha de Sabá, Vendida, Despeito e Infidelidade. O filme exala, sobretudo, elegância e sofisticação, à semelhança de A Dama, o que é seu maior mérito.

Ninguém Ama Ninguém..., como Traição, tem a estrutura das tramas em episódios tão comuns no cinema italiano e francês da década de 60 com uma vantagem em relação ao filme de 1997: o elo entre as histórias é configurado logo no início, na presença do garçom interpretado por Ernani Morais, que está às voltas com dívidas e a esposa à beira da morte.

Marcelo Faria faz o homem que cava demissão no emprego para casar com uma mulher rica e logo descobrir que ela não passa de uma megera. Gabriela Duarte é a esposa que não consegue fugir à tentação de traição com o melhor amigo do marido. Branca Messina resolve se vingar de uma vida de humilhação, mas coloca o pretenso amante em uma cilada. Julia Lund encontra solução nada ortodoxa para se livrar do boa-vida que a explora.

O essencial de Ninguém Ama Ninguém... está no humor que impregna as tramas de vingança e traição que são fechadas, com círculo de nobreza, pela surpreendente história do garçom. 

Mas o filme se perde justamente no que persegue com tanto carinho, a unidade. A história vivida por Messina, por exemplo, é sintomática: fecha-se muito antes do final de Ninguém Ama Ninguém... como se tivesse que ser resolvida às pressas, desarticulando a narrativa.

Nelson

É bom lembrar que, ao lado de Jorge Amado, Nelson Rodrigues é o escritor brasileiro com maior número de adaptações para o cinema. Filmes como Boca de Ouro (1963), de Nelson Pereira dos Santos, A Falecida (1965), de Leon Hirszman, e Toda Nudez Será Castigada (1973), de Arnaldo Jabor, estão entre os melhores que surgiram de sua obra.

Há também um sem-número de adaptações que vieram logo a seguir, que merecem revisão, além de A Dama do Lotação: Os Sete Gatinhos (1980), também de Neville, O Beijo no Asfalto (1980), de Bruno Barreto, Engraçadinha (1981), de Haroldo Marinho Barbosa, e a trilogia de Braz Chediak formada por Bonitinha Mas Ordinária (1980), Álbum de Família (1981) e Perdoa-me Por Me Traíres (1983). Do tempo em que o cinema brasileiro ardia em desejo, sexo e transgressão.